19 de abril de 2020

Contrastes

Do outro lado da rua, uma BMW para no meio do trânsito. De dentro do carro, do lado do passageiro, saem primeiro as pernas brancas e magras, se equilibrando sobre saltos altos. Ela usava um scarpin que estampava alguma marca gringa. Uma loura alta com um casaco pomposo e óculos escuros Louís Vuitton desce do veículo falando e rindo alto ao celular, um iphone desses de última geração. Caminha despreocupada com a fila de carros que se formava atrás atrás da BMW que continuava parada no meio da rua.
Contornou o carro, deixando um rastro de perfume doce. Dolce Gabanna, eu arriscaria. Perfume que se misturava com o cheiro característico do Centro de Belo Horizonte, capital mineira: cheiro urbano de urina e óleo velho de fritura. Também, o odor característico não poderia ser diferente. Em praticamente cada esquina, uma lanchonete oferece pastéis a preço popular. E a cada quarteirão, um morador de rua divide um espaço improvisado na calçada com material reciclável e acaba usando qualquer canto próximo como banheiro.
E foi exatamente essa cena que surgiu quando o motorista da BMW acelerou: enquanto a loura esguia entrou em uma boutique, sentado sobre as caixas de papelão desfeitas e com um olhar lânguido, um homem lhe estendia a mão.
_ Me dá uma moeda pra eu comprar uma marmita, moça.
Aquele era Jeremias, ex-comerciante do interior da Bahia que há 15 anos morava nas ruas da capital mineira. Mas a loura, em passos rápidos e largos, nem olhou para ele. Continuou no telefone enquanto entrava na loja e era recebida com uma xícara de café e alguns biscoitos holandeses servidos pela vendedora em uma bandeja. Aqueles eram seus prediletos.
Do lado de cá da vitrine, Jeremias se ajeitou com sua coberta de forma que também acomodasse o único companheiro de sua moradia improvisada: um vira-lata amarelo que, dormindo, parecia não se preocupar com a manhã nublada e fria daquele inverno.

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