9 de março de 2015

Dia fora do tempo

-O que foi? - ele sorriu ao ver que ela virava seu rosto rosado. Ele fitava seus olhos insistentemente depois de uma risada. Seus olhos castanhos brilhavam. Quase que podia ver seus próprios olhos refletidos nos olhos dele. Estavam fixos nos seus por alguns instantes e só sorriam, não falavam nada. Tentou fugir do olhar dele.

-Não! Espera! - riu Felipe – quanto tempo será que falta para completar quatro minutos? - disse numa voz rouca.

Marina não respondeu. Deu um sorriso discreto e ficou ali, apreciando os olhos de Felipe.

Não precisaria nem dos quatro minutos recomendados por aquele cientista. Sua pele morena tinha apenas um lado iluminado pelos raios alaranjados do sol que se deitava no horizonte, por trás das árvores do parque. As folhas das árvores balançavam compondo uma dança de luzes em sua face. A brisa fresca daquele final de tarde trazia o cheiro de orvalho da grama, misturado com o perfume de Felipe. Não precisaria de quatro minutos. Nem da noite, nem do tempo.

Se conheceram sem compromisso, sem expectativas. Ela estava ansiosa para encontrá-lo. E ele para desenhar seus lábios com os dedos, sentir o calor da sua pele, a textura de couve madura de seu rosto. E falaram muito um ao outro, quase nenhuma palavra. Mas apenas com os olhos, cheios de suspiros e carícias. Marina fechou os olhos e percorreu com a palma da sua mão todo rosto fino de Felipe. Em seu pensamento, a imagem de seu rosto ia se formando em meio àquela imensidão escura de dentro de sua pupila. Felipe, delirava nas mãos de Marina, acompanhava em movimentos lentos a palma da sua mão. Seus lábios entreabertos, cheios de prazer, convidavam para mais um beijo de Marina. Para mais um roçar de bocas cheias de ternura e desejo, num respirar ofegante, como se lhes faltasse o ar.

E ainda com os olhos fechados, concentrou seu pensamento em cada som que compunha aquele momento. No barulho de carro passando longe dali, de pessoas que caminhavam naquela praça, da respiração de Felipe e do pulsar do seu coração. Concentrou seu pensamento naquele cheiro de noite fresca misturado ao cheiro da roupa de Felipe; na textura da sua pele, do seu rosto.

Agora, Marina abria os olhos lentamente. Ela ainda sentia toda aquela falta de ar. A sua frente, suas mãos dançavam no vento que adentrava seu quarto pela fresta da janela. Sorriu ternamente. A mãos de Marina continuavam ali, acariciando o ar no formato do rosto de Felipe. Seus olhos continuavam ali, olhando para aquela lembrança num ponto infinito no seu quarto. Seu corpo ainda estremecia, no mesmo ritmo que outrora estremecia na presença dele dentro dela. Mas ele continuava dentro dela. E o pensamento dela continuava nele, naquela praça da estação, naquele pôr-do sol, naquele dia fora do tempo.